Jovens em Ação na Criação de Cidades Inclusivas


O projeto Jovens em Ação na Criação de Cidades Inclusivas é coordenado pela Universidade de Edimburgo e conta com parceiros no Brasil - CIESPI/PUC-Rio - e na Índia - Youth for Unity and Voluntary Action (YUVA), Fields of View (FoV) e National Institute of Urban Affairs (NIUA). Ele visa estimular a participação e o protagonismo juvenil nos processos de construção, implementação e monitoramento de políticas públicas, especialmente no que tange a sua inserção produtiva. No Brasil, sob a coordenação da professora Irene Rizzini, o CIESPI/PUC-Rio vem trabalhando com o Fórum Juventude Sul Fluminense em Ação, que atua em Volta Redonda (FJSFA-VR). Propusemos que eles compartilhassem conosco sua visão sobre o tema. Este foi o resultado:

Juventude e Protagonismo: A onda em resposta aos dilemas deste século
Autor: Fórum Juventude Sul Fluminense em Ação (FJSFA)

As crianças, adolescentes e jovens desempenham papel fundamental na transformação da cidadania e da democracia ao longo das eras. Na redemocratização do Brasil, as classes estudantis firmaram sua importância quando conquistaram o direito ao voto direto, com o voto a partir dos 16 anos de idade. Também na constituição de 1988, avançaram em uma série de direitos em defesa da educação, da proteção integral e justiça social.

A participação social e inserção do cidadão na esfera pública não se restringe somente a práticas orçamentárias e tão pouco a momentos de decisão do voto. Volta Redonda, por exemplo, tem uma cultura, que começa na época da redemocratização, na qual os movimentos sociais, como o Movimento Ética na Política (MEP/VR) , as instituições não governamentais que prestavam serviços sociais e as Comunidades Eclesiais de Base desempenharam papel fundamental na construção de uma sociedade civil organizada, se mobilizando em prol do fortalecimento e instrumentalização dos mecanismos de controle e participação social, de modo a garantir e perpetuar tal protagonismo.

Um destes casos, é o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, que em sua história é formado pela mobilização social de mães, mulheres e entidades de direitos humanos que, após um ano de promulgação da lei federal do Estatuto da Criança e Adolescente - regramento esse que vem para superar o antigo código do menor, que torna a criança e adolescente também sujeito de direitos e não mais objeto, construído e defendido por essa mesma sociedade civil organizada -, pressionaram o poder público a instituir o Conselho. Um espaço em que a sociedade civil, através das organizações e do governo discutem as políticas públicas para esse público, além de fiscalizar e supervisionar as políticas voltadas para a criança e o adolescente. De acordo com o artigo 7º da Lei Municipal nº 4866, da Câmara Municipal de Volta Redonda, “o CMDCA, vinculado à Secretaria Municipal de Governo, é órgão deliberativo e fiscal e controlador da política de atendimentos aos direitos da criança e do adolescente e das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas.” (VOLTA REDONDA, 2012). Essa é considerada uma das legislações mais avançadas no que diz respeito ao protagonismo, participação e controle social dos conselhos setoriais no Brasil. Não obstante que, em três décadas de funcionamento, esse conselho ganhou tamanha visibilidade por avançar em diversas áreas tanto de participação como tomada de decisão das políticas.

Considerado por lei o órgão de decisão final sobre qualquer política para criança e adolescente na cidade, superando até a distante e rígida democracia representativa, através do legislativo, o CMDCA tem poder para vetar uma lei que estipule qualquer política que envolva criança e adolescente, caso identifique irregularidade. Afinal, quem melhor para tratar de política para criança e adolescente se não o próprio conselho setorial? Também é referência em protagonismo, pois é o primeiro conselho deste tipo que tem assento para seu público, com direito a voz e voto. Dois assentos como conselheiros de direitos, infanto-juvenil, eleitos em fórum próprio.

Em Outubro de 2011, com a 1ª Conferencia Livre dos Direitos das Crianças e Adolescentes de Volta Redonda, foi despertado o interesse em alguns adolescentes por saber mais sobre o assunto e por esses adolescentes manifestarem interesse, foram convidados para participar de um encontro promovido pelo Fórum Estadual Juventude Carioca em Ação na ONG Se Essa Rua Fosse Minha no Rio de Janeiro no qual abordamos o tema “Adolescentes e Jovens no Enfrentamento a Violência Sexual no Estado do Rio de Janeiro. Então os adolescentes que foram para o encontro no Rio fizeram uma reunião de avaliação e percebemos que Volta Redonda também existia muitas violações de Direitos e precisávamos debater sobre as crianças e adolescentes do Sul Fluminense, surgindo então no final de 2011, o Fórum Juventude Sul Fluminense em Ação. Em 2012, a partir da alteração da Lei do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, dois assentos de conselheiros criança e adolescente foram criados e que estes conselheiros seriam eleitos entre os membros em um fórum próprio. A partir daí o Fórum participa de movimentos, atividades, seminários e conferências que envolvem o direito da criança e adolescente e, em um trabalho junto com o CMDCA, o Fórum faz a divulgação do ECA em palestras nas escolas, CRAS e entidades que trabalham com criança e adolescente. É um espaço para crianças e adolescentes discutirem juntos políticas públicas. Nossa intenção é proporcionar um local onde crianças, adolescentes e jovens possam se reunir e juntas se expressarem livremente. Um fórum construído por nós, crianças, adolescentes e jovens, para debater de forma livre e organizada temas pertinentes do nosso dia a dia, à luz das políticas públicas e direitos que nos são garantidos em lei.

Nesse sentido, a mudança de cultura já enrijecida na sociedade, é um processo contínuo de reeducação e reinserção deste sujeito enquanto cidadão da república, buscando quebrar as amarras, dogmas e preconceitos que dizem que criança e adolescente não pensam, não entendem e não tem vez ou voz. Mas é mostrar que eles são sujeitos de direitos, entendem e, sabem como ninguém seus problemas vividos e as formas como superá-los. Para tanto, devem ser inseridos também no escopo dos espaços de discussão e formulação das políticas públicas, se tornarem protagonistas da construção e elaboração das políticas públicas, bem como parte integrante do processo de tomada de decisão, em todos os ambientes. Graças a essa mobilização, Volta Redonda se tornou pioneira nesta área e tem se expandido para diversas outras. Este fórum não só elege, como organiza e executa as conferências municipais dos direitos da criança e adolescente, a convite do próprio conselho. Dentre outros tantos exemplos, temos o convite para elaborar conferências a nível estadual e até encontros latino-americanos e caribenhos que integram a Rede Latino-Americana e Caribenha de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (REDLAMYC) , o que possibilitou a construção de uma proposta de política regional aos países do bloco, além de pesquisas vindas de demanda dos próprios membros do FJSFA, para identificar problemas públicos pertinentes a região em que atuamos, como a percepção da violência na cidade de Volta Redonda em 2014 que possibilitou novos caminhos e diálogos na sociedade, tudo isso com protagonismo e participação das crianças, adolescentes e jovens. Tão condizente com seu slogan: “Não Fale de Mim sem Mim, Fale de Mim Comigo!”

Observem que as conquistas e avanços são propiciadas por uma sociedade civil organizada, que encontrou um ambiente favorável para florescer o debate de ideias, além da liberdade e oportunidade de participação e protagonismo, onde a sociedade tem aproveitado ao máximo e buscado a cada dia avançar. Claro que há dificuldades e barreiras impostas. Tanto pelo Estado, quanto por seus agentes, pois para ampliar a autonomia e criar mais espaços de construção e decisão é preciso o outro lado ceder seu poder e autoridade, o que é um processo árduo e complexo e que, muitas das vezes, requer disposição política. Além disso, temos uma cultura imposta e estruturada que afasta o indivíduo de seu papel de cidadão na sociedade e perante o Estado.

Atualmente, através de parcerias e projetos com o ambiente acadêmico, avançamos na construção de políticas públicas de qualidade, modernas, eficientes e condizentes com o contexto da população infanto-juvenil, como a participação direta em todo o processo de construção do Plano Municipal para a Infância e Adolescência de Volta Redonda, no qual se estipulou diretrizes e ações para nortear as próximas ações públicas orientadas a esse público-alvo. É a junção da práxis com o saber teórico, para finalmente transformarmos as políticas públicas e as ações governamentais em prol de uma sociedade mais justa. Assim como as juventudes têm sido agentes de transformações para o futuro, pelas eras, o Séc. XXI mostra uma juventude que não se acomoda ou acovarda com a mudança, pelo contrário, planeja, constrói e direciona sua visão transformadora para o futuro que almeja. Somos uma rede interligada, coesa e em uma só voz que força as velhas classes políticas acomodadas e a toda sociedade inerte e paralisada a acordar e se movimentar neste contexto. Vide o caso da ativista ambiental Greta Thunberg, ou os movimentos de jovens na América Latina. De uma ponta a outra estão avançando e aprofundando as transformações nas velhas estruturas de política autoritária, vertical e burocrática. Ao ponto de conseguirem até convocar uma assembleia constituinte para revogar a antiga, ditatorial, historicamente imposta, como é o caso do Chile, ou renovando a política e o seu modo de fazê-la, como é o caso do Peru, entre tantos outros casos. A força de transformação juvenil é como uma árvore frondosa, que perfura o endurecido e estático concreto com suas raízes e o quebra de dentro para fora, se firmando e fortalecendo sua base que é constituída de solidariedade, altivez, disposição, princípios e valores inerentes à democracia. Enquanto isso, se ergue e sobe para superar as barreiras da desigualdade, da miséria e da pobreza, rumo ao céu, livre das amarras impostas pelas velhas práticas. Hoje, essa força floresce para se ramificar e espalhar seu fruto a todos os lugares. Disseminando justiça, renovação, solidariedade, participação, protagonismo e transformação, rumo a uma sociedade e uma humanidade melhor.

O Fórum Juventude Sul Fluminense em Ação, nesta nova empreitada, é mais uma ramificação dessa árvore de fruto tão doce que é a participação social e protagonismo das crianças, adolescentes e jovens. No projeto “Jovens em ação na criação de cidades inclusivas”, junto com o CIESPI/PUC-Rio e nossos parceiros internacionais , buscamos pensar mudanças que contribuam para a construção de cidades justas e democráticas.

Referências

CPDOC | FGV. Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil.COMUNIDADES ECLESIAIS DE BASE (CEBs). 2020. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/comunidades-eclesiais-de-base-cebs. Acesso em: 29/12/2020

MEP/VR. Movimento Ética na Política. 2020. Disponível em: https://mepvr.com.br/. Acesso em: 29/12/2020.

VOLTA REDONDA. Lei Municipal nº 4.866 de 03/04/2012. Disponível em:https://sapl.voltaredonda.rj.leg.br/media/sapl/public/normajuridica/2012/2553/2553_texto_integral.pdf. Acesso em: 30/12/2020.

REDLAMYC. Red Latinoamericana y Caribeña por la defensa de los derechos de los niños, niñas y adolescentes. 2021. Disponível em: http://redlamyc.org/v1/. Acesso em 01/03/2021.

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